O LIVRO

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terça-feira, 2 de dezembro de 2014

Dia Internacional da Abolição da Escravatura - UM CRIME CONTRA A HUMANIDADE


A abolição do comércio transatlântico de escravos no século XIX não erradicou esta prática mundial. Pelo contrário, assumiu outras formas, que persistem ainda hoje: escravatura, servidão por dívida e trabalho forçado ou obrigatório, tráfico de mulheres e crianças, escravatura doméstica e prostituição forçada, incluindo de crianças, escravatura sexual, casamentos forçados e venda de esposas, trabalho infantil e servidão infantil, entre outros.
Esta realidade obriga a comunidade internacional a manter-se vigilante e a intensificar os seus esforços para erradicar as formas contemporâneas de escravatura. A escravatura moderna é um crime e as pessoas que o cometem, toleram ou facilitam devem ser levados perante a justiça. As vítimas e os sobreviventes têm direito a recurso e a reparação.

A preocupação da comunidade internacional com a situação das pessoas que vivem em condições de escravatura deu origem à criação de vários instrumentos jurídicos importantes, o mais recente dos quais é o Protocolo para Prevenir, Reprimir e Punir o Tráfico de Pessoas, Especialmente Mulheres e Crianças, que entrou em vigor em 2003 como um complemento da Convenção das Nações Unidas contra o Crime Organizado Transnacional.

Jurisdições de todo o mundo abriram o caminho para novos avanços nos processos judiciais de reparação. O Tribunal Internacional de Justiça contribuiu para o reconhecimento da escravatura como crime contra a humanidade e o direito a não ser submetido à escravatura é considerado tão fundamental que todas as nações têm legitimidade para levas a Tribunal todos os Estados transgressores.

O Tribunal Penal Internacional para a Ex-Jugoslávia formulou uma acusação de escravatura como crime contra a humanidade por atos de violação e escravatura. E o Tribunal de Justiça da Comunidade Economica dos Estados Oeste Africano (CEDEAO) declarou recentemente que a escravatura é um crime contra a humanidade.

Ban Ki-moon - Secretário Geral da ONU
Neste Dia Internacional, exorto todos os Estados a ratificarem e aplicarem os instrumentos jurídicos e a cooperarem plenamente com o Relator Especial da ONU sobre formas contemporâneas de escravatura. Faço também um apelo a todos os Estados membros da ONU, para que contribuam generosamente para o Fundo Voluntário das Nações Unidas sobre Formas Contemporâneas de Escravatura, que tem ajudado milhares de vítimas a recuperar a vida e a dignidade.

fonte: Mensagem do Secretário Geral Ban Ki-moon - Dia Internacional da Abolição da Escravatura - 2 de Dezembro de 2010


quinta-feira, 20 de novembro de 2014

Nossa História, Nossa Literatura - O NAVIO NEGREIRO - Castro Alves

Castro Alves





Com imagens do filme Amistad, realizado por Steven Spielberg. Escute Tragédia no mar (ou O navio negreiro) de Castro Alves, na voz de Paulo Autran.

O poeta Castro Alves escreveu O navio negreiro aos 22 anos, em 1869. A lei Eusébio de Queirós, que proibia o tráfico de escravos, fora promulgada quase vinte anos antes. Cada parte do poema tem métrica própria, de maneira que o ritmo de cada estrofe retrata a situação apresentada nela. 




navio negreiro




O NAVIO NEGREIRO
Castro Alves

I
'Stamos em pleno mar... Doudo no espaço 
Brinca o luar — dourada borboleta; 
E as vagas após ele correm... cansam 
Como turba de infantes inquieta.

'Stamos em pleno mar... Do firmamento 
Os astros saltam como espumas de ouro... 
O mar em troca acende as ardentias, 
— Constelações do líquido tesouro... 

'Stamos em pleno mar... Dois infinitos 
Ali se estreitam num abraço insano, 
Azuis, dourados, plácidos, sublimes... 
Qual dos dous é o céu? qual o oceano?... 

'Stamos em pleno mar. . . Abrindo as velas 
Ao quente arfar das virações marinhas, 
Veleiro brigue corre à flor dos mares, 
Como roçam na vaga as andorinhas... 

Donde vem? onde vai? Das naus errantes 
Quem sabe o rumo se é tão grande o espaço? 
Neste saara os corcéis o pó levantam, 
Galopam, voam, mas não deixam traço. 

Bem feliz quem ali pode nest'hora 
Sentir deste painel a majestade! 
Embaixo — o mar em cima — o firmamento... 
E no mar e no céu — a imensidade! 

Oh! que doce harmonia traz-me a brisa! 
Que música suave ao longe soa! 
Meu Deus! como é sublime um canto ardente 
Pelas vagas sem fim boiando à toa! 

Homens do mar! ó rudes marinheiros, 
Tostados pelo sol dos quatro mundos! 
Crianças que a procela acalentara 
No berço destes pélagos profundos! 

Esperai! esperai! deixai que eu beba 
Esta selvagem, livre poesia 
Orquestra — é o mar, que ruge pela proa, 
E o vento, que nas cordas assobia... 
.......................................................... 
Por que foges assim, barco ligeiro? 
Por que foges do pávido poeta? 
Oh! quem me dera acompanhar-te a esteira 
Que semelha no mar — doudo cometa! 

Albatroz! Albatroz! águia do oceano, 
Tu que dormes das nuvens entre as gazas, 
Sacode as penas, Leviathan do espaço, 
Albatroz! Albatroz! dá-me estas asas. 

II

Que importa do nauta o berço, 
Donde é filho, qual seu lar? 
Ama a cadência do verso 
Que lhe ensina o velho mar! 
Cantai! que a morte é divina! 
Resvala o brigue à bolina 
Como golfinho veloz. 
Presa ao mastro da mezena 
Saudosa bandeira acena 
As vagas que deixa após. 

Do Espanhol as cantilenas 
Requebradas de langor, 
Lembram as moças morenas, 
As andaluzas em flor! 
Da Itália o filho indolente 
Canta Veneza dormente, 
— Terra de amor e traição, 
Ou do golfo no regaço 
Relembra os versos de Tasso, 
Junto às lavas do vulcão! 

O Inglês — marinheiro frio, 
Que ao nascer no mar se achou, 
(Porque a Inglaterra é um navio, 
Que Deus na Mancha ancorou), 
Rijo entoa pátrias glórias, 
Lembrando, orgulhoso, histórias 
De Nelson e de Aboukir.. . 
O Francês — predestinado — Canta os louros do passado 
E os loureiros do porvir! 

Os marinheiros Helenos, 
Que a vaga jônia criou, 
Belos piratas morenos 
Do mar que Ulisses cortou, 
Homens que Fídias talhara, 
Vão cantando em noite clara 
Versos que Homero gemeu ... 
Nautas de todas as plagas, 
Vós sabeis achar nas vagas 
As melodias do céu! ... 

III

Desce do espaço imenso, ó águia do oceano! 
Desce mais ... inda mais... não pode olhar humano 
Como o teu mergulhar no brigue voador! 
Mas que vejo eu aí... Que quadro d'amarguras! 
É canto funeral! ... Que tétricas figuras! ... 
Que cena infame e vil... Meu Deus! Meu Deus! Que horror!

IV

Era um sonho dantesco... o tombadilho 
Que das luzernas avermelha o brilho. 
Em sangue a se banhar. 
Tinir de ferros... estalar de açoite... 
Legiões de homens negros como a noite, 
Horrendos a dançar... 

Negras mulheres, suspendendo às tetas 
Magras crianças, cujas bocas pretas 
Rega o sangue das mães: 
Outras moças, mas nuas e espantadas, 
No turbilhão de espectros arrastadas, 
Em ânsia e mágoa vãs! 

E ri-se a orquestra irônica, estridente... 
E da ronda fantástica a serpente 
Faz doudas espirais ... 
Se o velho arqueja, se no chão resvala, 
Ouvem-se gritos... o chicote estala. 
E voam mais e mais... 

Presa nos elos de uma só cadeia, 
A multidão faminta cambaleia, 
E chora e dança ali! 
Um de raiva delira, outro enlouquece, 
Outro, que martírios embrutece, 
Cantando, geme e ri! 

No entanto o capitão manda a manobra, 
E após fitando o céu que se desdobra, 
Tão puro sobre o mar, 
Diz do fumo entre os densos nevoeiros: 
"Vibrai rijo o chicote, marinheiros! 
Fazei-os mais dançar!..." 

E ri-se a orquestra irônica, estridente. . . 
E da ronda fantástica a serpente 
 Faz doudas espirais... 
Qual um sonho dantesco as sombras voam!... 
Gritos, ais, maldições, preces ressoam! 
 E ri-se Satanás!... 

V

Senhor Deus dos desgraçados! 
Dizei-me vós, Senhor Deus! 
Se é loucura... se é verdade 
Tanto horror perante os céus?! 
Ó mar, por que não apagas 
Co'a esponja de tuas vagas 
De teu manto este borrão?... 
Astros! noites! tempestades! 
Rolai das imensidades! 
Varrei os mares, tufão!

Quem são estes desgraçados 
Que não encontram em vós 
Mais que o rir calmo da turba 
Que excita a fúria do algoz? 
Quem são? Se a estrela se cala, 
Se a vaga à pressa resvala 
Como um cúmplice fugaz, 
Perante a noite confusa... 
Dize-o tu, severa Musa, 
Musa libérrima, audaz!... 

São os filhos do deserto, 
Onde a terra esposa a luz. 
Onde vive em campo aberto A tribo dos homens nus... 
São os guerreiros ousados 
Que com os tigres mosqueados 
Combatem na solidão. 
Ontem simples, fortes, bravos. 
Hoje míseros escravos, 
Sem luz, sem ar, sem razão. . . 

São mulheres desgraçadas, 
Como Agar o foi também. 
Que sedentas, alquebradas, 
De longe... bem longe vêm... 
Trazendo com tíbios passos, 
Filhos e algemas nos braços,

N'alma — lágrimas e fel... 
Como Agar sofrendo tanto, 
Que nem o leite de pranto 
Têm que dar para Ismael. 

Lá nas areias infindas, 
Das palmeiras no país, 
Nasceram crianças lindas, 
Viveram moças gentis... 
Passa um dia a caravana, 
Quando a virgem na cabana 
Cisma da noite nos véus ... 
... Adeus, ó choça do monte, 
... Adeus, palmeiras da fonte!... 
... Adeus, amores... adeus!... 

Depois, o areal extenso... 
Depois, o oceano de pó. 
Depois no horizonte imenso 
Desertos... desertos só... 
E a fome, o cansaço, a sede... 
Ai! quanto infeliz que cede, 
E cai p'ra não mais s'erguer!... 
Vaga um lugar na cadeia, 
Mas o chacal sobre a areia 
Acha um corpo que roer. 

Ontem a Serra Leoa, 
A guerra, a caça ao leão, 
O sono dormido à toa 
Sob as tendas d'amplidão! 
Hoje... o porão negro, fundo, 
Infecto, apertado, imundo, 
Tendo a peste por jaguar... 
E o sono sempre cortado 
Pelo arranco de um finado, 
E o baque de um corpo ao mar...

Ontem plena liberdade, 
A vontade por poder... 
Hoje... cúm'lo de maldade, 
Nem são livres p'ra morrer. . 
Prende-os a mesma corrente 
— Férrea, lúgubre serpente — 
Nas roscas da escravidão. 
E assim zombando da morte, 
Dança a lúgubre coorte 
Ao som do açoute... Irrisão!... 

Senhor Deus dos desgraçados! 
Dizei-me vós, Senhor Deus, 
Se eu deliro... ou se é verdade 
Tanto horror perante os céus?!... 
Ó mar, por que não apagas 
Co'a esponja de tuas vagas 
Do teu manto este borrão? 
Astros! noites! tempestades! 
Rolai das imensidades! 
Varrei os mares, tufão! ... 

VI

Existe um povo que a bandeira empresta 
P'ra cobrir tanta infâmia e cobardia!... 
E deixa-a transformar-se nessa festa 
Em manto impuro de bacante fria!... 
Meu Deus! meu Deus! mas que bandeira é esta, 
Que impudente na gávea tripudia? 
Silêncio. Musa... chora, e chora tanto 
Que o pavilhão se lave no teu pranto! ... 

Auriverde pendão de minha terra, 
Que a brisa do Brasil beija e balança, 
Estandarte que a luz do sol encerra 
E as promessas divinas da esperança... 
Tu que, da liberdade após a guerra, 
Foste hasteado dos heróis na lança 
Antes te houvessem roto na batalha, 
Que servires a um povo de mortalha!... 

Fatalidade atroz que a mente esmaga! 
Extingue nesta hora o brigue imundo 
O trilho que Colombo abriu nas vagas, 
Como um íris no pélago profundo! 
Mas é infâmia demais! ... Da etérea plaga 
Levantai-vos, heróis do Novo Mundo! 
Andrada! arranca esse pendão dos ares! 
Colombo! fecha a porta dos teus mares! 





Nossa História - A ESCRAVIDÃO - literatura de Cordel





A ESCRAVIDÃO

Sobre a história do Brasil
Quero fazer um relato
A quem muito merece
E está no anonimato
Que gerou muita riqueza
E só recebeu desacato.

Estou falando dos Negros
Que vieram lá da África
Pra trabalhar nos engenhos
Da elite aristocrática
A ganância portuguesa
Usava sempre essa prática.

Os senhores de engenho
Conhecidos por patrão
Fortalecem esse insulto
Dessa tal escravidão
Vitimando todos nós
Na intensa exploração.

Eram comprados em lotes
Nos mercados de Olinda
Depois de negociados
Ficavam numa berlinda
Além de trabalhar muito
Maltratados eram ainda.

Era tão dura a jornada
Mesmo antes do sol romper
Triste de quem reclamava
Pros castigos receber
Pra não sofrer mais ainda
Tinha só que obedecer.

Castigos de todo tipo
Recebiam dos seus donos
De martelada nos dentes
Sofrimentos e danos
Era uma vida difícil
Um completo abandono.

Diante do sofrimento
As fugas já começaram
Surgiu o grande Zumbi
E logo se organizaram
Sob a sua liderança
As batalhas enfrentaram.

Os escravos fugitivos
Formaram comunidades
No quilombo dos palmares
Sonhavam com a liberdade
Direito que eles não tinham
Naquela sociedade.

Geraram muita riqueza
Com a colonização
Mesmo com a independência
Pro negro não mudou não
Tudo continuou na mesma
Preservando a escravidão.

Depois de muita batalha
E imposição estrangeira
É que finalmente acaba
A escravidão brasileira
E no cenário mundial
Foi assim a derradeira.

Foi no dia 13 de Maio
Do século XIX
Que a Princesa Isabel
A abolição promove
Assinando a Lei Áurea
A escravidão absolve.

Mas até hoje se ver
O negro discriminado
Sofre pra arrumar vaga
De trabalho no mercado
Herança que foi deixada
Por nossos antepassados.

Não tenha você também
Esse tal de preconceito
Não cometa esse crime
Nem tenha esse defeito
Pois somos todos iguais
Temos o mesmo direito.

A todos os brasileiros
Que formam essa nação
Somos brancos, negros, índios
Nessa miscigenação
Vivamos a diferença
Da grande aculturação.

Se Deus não faz distinção
Nós não devemos fazer
Somos obra da criação
O negro eu e você
Vivamos em união
Para em paz se viver.

Dia 20 de Novembro
É festa na pátria inteira
Uma data festejada
Pela nação brasileira
Dia da consciência negra
Povo de alma guerreira.

Juarês Alencar Pereira.
DRE - Colinas

Saiba mais sobre o cordelista Juarês Alencar Pereira
em seu blog http://juaresdocordel.blogspot.com.br/

pintura de Jean Baptiste Debret - O engenho

Nossa História - A CANÇÃO DO AFRICANO - CASTRO ALVES


mãe africana



A CANÇÃO DO AFRICANO

senzala   
Lá na úmida senzala,
Sentado na estreita sala,
Junto ao braseiro, no chão,
Entoa o escravo o seu canto,
E ao cantar correm-lhe em pranto
Saudades do seu torrão...

De um lado, uma negra escrava
Os olhos no filho crava,
Que tem no colo a embalar...
E à meia voz lá responde
Ao canto, e o filhinho esconde,
Talvez p’ra não o escutar!

“Minha terra é lá bem longe,
Das bandas de onde o Sol vem;
Esta terra é mais bonita,
Mas à outra eu quero bem!

O Sol faz lá tudo em fogo,
Faz em brasa toda a areia;
Ninguém sabe como é belo
Ver de tarde a papa-ceia!

Aquelas terras tão grandes,
Tão compridas como o mar,
Com suas poucas palmeiras
Dão vontade de pensar...

Lá todos vivem felizes,
Todos dançam no terreiro;
A gente lá não se vende
Como aqui, só por dinheiro.”

O escravo calou a fala,
Porque na úmida sala
O fogo estava a apagar;
E a escrava acabou seu canto,
P’ra não acordar com o pranto
O seu filhinho a sonhar!

O escravo então foi deitar-se,
Pois tinha de levantar-se
Bem antes do Sol nascer,
E se tardasse, coitado,
Teria de ser surrado,
Pois bastava escravo ser.

E a cativa desgraçada
Deita seu filho, calada,
E põe-se triste a beija-lo,
Talvez temendo que o dono
Não viesse, em meio do sono,
De seus braços arrancá-lo

                   Castro Alves
                    Recife, 1863

Uma análise sobre este poema consulte http://conversadeportugues.com.br/2013/10/cancao-do-africano/

terça-feira, 18 de novembro de 2014

Nossa História - ALEIJADINHO - Um dos maiores representantes das artes plásticas brasileira


Igreja de São Francisco de Assis (iniciada em 1766) em Ouro Preto, MG. Uma das sete maravilhas de obras de origem  portuguesa no mundo. Uma obra prima de Aleijadinho.



Aleijadinho (Antônio Francisco da Costa Lisboa)

29/08/1730, Vila Rica (atual Ouro Preto), MG
18/11/1814, Mariana (MG) – escultor e arquiteto brasileiro

provável rosto de Aleijadinho


"Bíblia de pedra sabão, banhada no ouro das Minas." Assim o poeta Oswald de Andrade definiu os Passos da Paixão e os 12 Profetas, as obras mais conhecidas do Aleijadinho, na cidade de Congonhas do Campo em Minas Gerais. De fato, o escultor conseguiu traduzir para a pedra a espiritualidade das Escrituras.
Antônio Francisco da Costa Lisboa era filho de Manoel Francisco Lisboa e de uma escrava que se chamava Isabel (embora nenhum documento o comprove), e sobrinho de Antônio Francisco Pombal, afamado entalhador de Vila Rica. A data oficial de seu nascimento é 29 de agosto de 1730, mas também não há certeza quanto a isso.
De educação escolar primária, iniciou seu trabalho como escultor e entalhador ainda criança, seguindo os passos do pai e trabalhando na oficina do tio. Seu aprimoramento profissional veio de seus contatos com o abridor de cunhos e desenhista João Gomes Batista e o escultor e entalhador José Coelho de Noronha, portugueses com oficinas em Vila Rica e responsáveis por muitas obras em igrejas da região.
Mesmo que tenha sido um dos maiores artistas do Brasil, restam apenas fragmentos biográficos da vida do Aleijadinho, a maioria deles envolta em lendas. Sua primeira biografia "Traços Biográficos Relativos ao Finado Antônio Francisco Lisboa", escrita apenas 44 dias depois de sua morte, por Rodrigo Bretãs, é repleta de exageros, mostrando um artista que seria "dado aos vinhos, às mulheres e aos folguedos".

Profeta Daniel (pedra sabão), Santuário de Bom Jesus de Matosinhos (Congonhas-MG)

Aos 40 anos de idade, Antônio Francisco Lisboa foi atacado por uma doença que o deixou gravemente deformado. Existem apenas hipóteses sobre a terrível enfermidade. Em 1929, o médico Renê Laclette optou por "lepra nervosa" como diagnóstico "menos improvável", visto que no quadro clínico do escultor se encontravam também sintomas específicos do mal de Hansen. Outra hipótese citada com freqüência é a da zamparina (doença advinda de um surto gripal que irrompeu no Rio em 1780, responsável por alterações no sistema nervoso). As demais especulações, citadas em mais de 30 estudos, incluem escorbuto, encefalite e sífilis.
O fato é que, aos poucos, o Aleijadinho foi perdendo o vigor físico, o que não o impossibilitou de trabalhar. Conta-se que ao perder os dedos dos pés ele passou a andar de joelhos, protegendo-os com dispositivos de couro, ou a se fazer carregar. E ao perder os dedos das mãos, passou a esculpir com o cinzel e o martelo amarrados aos punhos. Em fins de 1777, o escultor já perdera os dedos dos pés, "do que resultou não poder andar senão de joelhos", e os dedos das mãos se atrofiaram de tal forma que o artista teria decidido cortá-los, servindo-se do formão com que trabalhava. Também perdeu quase todos os dentes, a boca entortou-se, o queixo e o lábio inferior abateram-se e o olhar adquiriu uma expressão sinistra que o deixou com um aspecto medonho.

Carregamento da Cruz  (escultura em madeira), Santuário de Bom Jesus de Matosinhos (Congonhas-MG)

O Aleijadinho passou a evitar o contato público: ia para o trabalho de madrugada e só voltava para casa com a noite alta. "Ia sempre a cavalo, embuçado em ampla capa, chapéu desabado, fugindo a encontros e saudações", escreveu o poeta Manuel Bandeira. No próprio local da obra, ficava coberto por uma espécie de tenda. Diz a lenda que, depois de ser chamado de "homem feio" por José Romão, ajudante-de-ordens do governador Bernardo Lorena, o artista se vingou esculpindo uma estátua de são Jorge com a cara "bestificada" de seu desafeto.
A doença dividiu em duas fases nítidas a obra do Aleijadinho. A fase sã, de Ouro Preto, se caracteriza pela serenidade equilibrada. Na fase do enfermo, surge um sentimento mais gótico e expressionista. O ressentimento tomou a expressão de revolta social contra a exploração da metrópole. As figuras de "brancos", "senhores" e "capitães romanos" são deformadas.
Suas obras mais famosas são o conjunto do Santuário de Bom Jesus de Matozinhos, em Congonhas do Campo, um patrimônio histórico e artístico com 66 imagens esculpidas em madeira de cedro (1796-1799) e os 12 majestosos profetas em pedra-sabão (1800-1805). Suas esculturas desviam-se do estilo barroco português, ganhando características muito pessoais, com alguma influência bizantina e gótica.
Os trabalhos do Aleijadinho podem ser vistos em Ouro Preto, Congonhas do Campo, Sabará e outras cidades mineiras. Observando-se os traços, as expressões das esculturas, é impossível evitar o sentimento de emoção e respeito que elas despertam. O esplendor e o requinte, as sutilezas e a suntuosidade das dezenas de estátuas, pias batismais, púlpitos, brasões, portais, fontes e crucifixos revelam que o Brasil teve um escultor e arquiteto de primeira grandeza nos tempos coloniais.

Principais obras de Aleijadinho:
Talha
- Retábulo da capela-mor da Igreja de São Francisco em São João del-Rei
- Retábulo da Igreja de São Francisco de Assis em Ouro Preto
-  Retábulo da Igreja de Nossa Senhora do Carmo em Ouro Preto
Arquitetura- Projetos de fachadas de duas igrejas (Igreja de São Francisco em São João del-Rei e Nossa Senhora do Carmo em Ouro Preto).
Escultura- Conjunto de esculturas do Santuário do Bom Jesus de Matosinhos (incluíndo as mais conhecidas: "Os Doze Profetas").


Ouro Preto

Ouro branco! Ouro preto! Ouro podre! De cada
Ribeirão trepidante e de cada recosto
De montanha o metal rolou na cascalhada
Para o fausto Del-Rei, para a gloria do imposto.

Que resta do esplendor de outrora? Quase nada:
Pedras... Templos que são fantasmas ao sol-posto.
Esta agencia postal era a Casa de Entrada...
Este escombro foi um solar... Cinza e desgosto!

O bandeirante decaiu – é funcionário.
Ultimo sabedor da crônica estupenda,
Chico Diogo escarnece o ultimo visionário.

E avulta apenas, quando a noite de mansinho
Vem, na pedra-sabão, lavrada como renda,
- Sombra descomunal, a mão do Aleijadinho!

Glossário:
avulta: cresce, aumenta
escarnece: zomba, debocha
escombro: ruína
estupenda: admirável, extraordinária
fausto: luxo, pompa, ostentação
trepidante: que treme



fontes: educacao.uol.com.br/
             suapesquisa.com