AS PALAVRAS RESSUSCITARÃO - Jorge de Lima
As palavras envelheceram dentro dos homens
separadas em ilhas,
as palavras se mumificaram na boca dos legisladores;
as palavras apodreceram nas promessas dos tiranos;
as palavras nada significam nos discursos dos homens
públicos.
E o Verbo de Deus é uno mesmo com a profanação dos homens de
Babel,
mesmo com a profanação dos homens de hoje.
E, por acaso, a palavra imortal há de adoecer?
E, por caso, as grandes palavras semitas podem desaparecer?
E, por acaso, o poeta não foi designado para vivificar a
palavra de novo?
Para colhê-la de cima das águas e oferecê-la outra vez aos
homens do continente?
E, não foi ele apontado para restituir-lhe a sua essência,
e reconstituir seu conteúdo mágico?
Acaso o poeta não prevê a comunhão das línguas,
quando o homem reconquistar os atributos perdidos com a
Queda,
e quando se desfizerem as nações instaladas ao depois de
Babel?
Quando toda a confusão for desfeita,
o poeta não falará, do ponto em que se encontrar,
a todos os homens da terra, numa só língua — a linguagem do
Espírito?
Se por acaso viveis mergulhados no momento e no limite,
não me compreendereis, irmão!
COUTINHO, Afrânio (org.). Jorge de Lima. Obra Completa. Rio
de Janeiro: Editora José Aguilar, 1958, vol. I. p.467-468.
Jorge de Lima |
Jorge Mateus de Lima (União dos Palmares, 23 de abril de
1893 — Rio de Janeiro, 15 de novembro de 1953) foi um político, médico, poeta,
romancista, biógrafo, ensaísta, tradutor e pintor brasileiro. Inicialmente
autor de versos alexandrinos, posteriormente transformou-se em um modernista.
Era filho de um comerciante rico e mudou-se para Maceió em
1902, com a mãe e os irmãos. Em 1909 foi morar em Salvador onde iniciou os
estudos de medicina. Concluiu o curso no Rio de Janeiro em 1914, mas foi como
poeta que projetou seu nome. Neste mesmo ano publicou o primeiro livro, XIV
Alexandrinos.
Voltou para Maceió em 1915 onde se dedicou à medicina, além
da literatura e da política. Quando se mudou de Alagoas para o Rio, em 1930,
montou um consultório na Cinelândia, transformado também em ateliê de pintura e
ponto de encontro de intelectuais. Reunia-se lá gente como Murilo Mendes,
Graciliano Ramos e José Lins do Rego. Nesse período publicou aproximadamente
dez livros, sendo cinco de poesia. Também exerceu o cargo de deputado estadual,
de 1918 a 1922. Com a Revolução de 1930 foi levado a radicar-se definitivamente
no Rio de Janeiro.
Em 1939 passou a dedicar-se também às artes plásticas,
participando de algumas exposições. Em 1952, publicou seu livro mais
importante, o épico Invenção de Orfeu. Em 1953, meses antes de morrer, gravou
poemas para o Arquivo da Palavra Falada da Biblioteca do Congresso de
Washington, nos Estados Unidos.
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